quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

A missão

De repente, ficou quente e eu vi um clarão. Antes que pudesse me dar conta do que estava acontencendo, chega aos meus ouvidos

“Hey Sunshine!”

Tento em vão levantar os olhos e invade-me, mesmo por minhas pálpebras cerradas um clarão que me faz doer o cerebelo.

“Toma, kid”, diz com sua voz doce e imperativa um ser cuja fisicalidade não me era licito ainda explorar.

Tateio o vazio, sentindo falar mais forte os sons ao meu redor e o toque da relva onde eu então me deitara, num modorrento e mormacento dia, ao lado de um regato, numa atitude pastoral, mas pastoreando nada além de pensamentos que pastavam na minha mente.

Sinto com as pontas dos dedos uma estrutura plástico-metálica. Os dedos se fecham, e uma imagem se constrói no olho da minha mente. Óculos. De que servem óculos ao cego? Por que tanta luz?

Receando ser aquilo tudo uma piada de mal gosto, hesito, resisto, mas cedo ao impulso de vestir aqueles óculos ainda ouvindo ecos do “toma”, meio que impelido por esse ser que era só voz e luz.

Sinto um alívio.

Tentativamente vou abrindo os olhos, devagarzinho, sentindo a pupila contrair e dilatar, tão incerta quanto o meu todo. Quem teria vindo atrapalhar o sonho de um Caiero qualquer aos pés do regato?

“Você...”

“Sou um anjo. Dos piores tipos que você já conheceu. Eu jogo pros dois lados.”

E a imagem que foi se formando, me confundindo, era esse um íncubo? Rosto com uma tez deslumbrante. Daqueles que engana o tempo, ou simplesmente o ignora até o último momento. Pêssego eterno, veludo rosa, liso como pétala de rosa fresca. Vejo um sorriso. Mas, eita!, é o sorriso mais triste que você pode imaginar.

“Por que você brilha tanto?” perguntou ela para mim.

Foi então que percebi que ela também usava óculos. Escuros como a noite, ainda assim, uma falhada tentativa de eclipsar a luz mais brilhante que emanava de todos os lados.

“Não sou eu que estou a brilhar, é você! Nada brilhava até você chegar.”

“Perdão, mas tenho que dizer que como anjo eu digo apenas a verdade. A luz vem de você não de mim. Eu tenho uma missão, uma mensagem para você.”

Estava assustado. Aquilo não fazia o menor sentido. Como poderia eu brilhar e não sentir? Como poderia brilhar tanto que não me era possível resistir ao brilho? Eu sentia que a luz irradiava dela. Afinal, era ela o anjo. Teria eu morrido?

“Não, você esta vivo. E a cada dia ficará mais vivo, sua criatividade vai aumentar, sua tolerância, sua sabedoria”

“Você leu meus pensamentos?”

“Você pensa alto. Não é só de palavras que a comunicação entre os puros de coração e não tão puros do resto falam”

“Qual é sua mensagem?”

“Eu devo lhe dizer... eu... um dos lados pediu que... você foi escolhido, não! Eu fui escolhida para...”

Sentia a dúvida no coração do anjo e tentava tatear-lhe os pensamentos. Seria aquela uma via de mão dupla? A ansiedade crescia, e a luz ficava intermitente. Sentia que havia ali um esforço, uma guerra sendo travada. Sentia a presença de demônios e anjos assistindo a tudo, torcendo...

“É, sunshine, eu não me lembro.”

“Da sua mensagem?”

“É, da minha mensagem. Posso ficar por aqui e de repente o vento me conta, ou a chuva, ou alguém fofinho, qual era minha grande missão para você?”

“Pode. Fique a vontade. O mundo é grande e eu estou por aí. Você gosta de omeletes?”

“Sim. Mas eu quebro os ovos, ok?”

Um comentário:

  1. Hey kid,
    Texto profundo, meio sentimental demais para um caieiro ,talvez, mas lindo , tocante, admirável, como só voce é capaz de escrever.Íncubo ou súcubo?Anjo ou demônio, nenhum de nós é um ou outro, mas uma mistura dos dois.E aí é que esta a graça de tudo.:)
    bjs

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